quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Tintim por tintim


O MESQUINHO E A BELEZA ANÔNIMA
Fabiano Regis  é  Radialista.

O trote universitário, segundo pesquisadores, teve a sua origem na Europa, na Idade Média e chegou ao Brasil por volta dos anos 1800, quando surgiram as primeiras faculdades, com grande influência de Portugal. No apagar das luzes do ano de 2012, a Avenida Presidente Dutra voltou a ser palco desta mácula que perdura no seio da cultura acadêmica brasileira por mais de dois séculos. É importante ressaltar que o resultado do vestibular aguça o ego de quem tem o nome na lista dos aprovados. Sabendo disso, os organizadores do trote que se imaginam superiores, aproveitam o momento de deslumbramento de alguns para colocar em prática um escárnio que se aproxima aos moldes medievais. O “trote pedágio”, por exemplo, aquele em que os calouros são obrigados a pedir dinheiro nos semáforos aos motoristas e só terminam a tarefa quando atingem o valor estipulado pelos veteranos, é uma prática recorrente por aqui.
Na primeira semana de dezembro eu parei num sinal e uma moça caminhou em minha direção. Ao aproximar-se, observei que o produto misturado com tinta que lambuzava o seu rosto, não era forte o suficiente para ocultar tanta formosura. A caloura ainda cheirando a adolescência estirou a mão e mendigou: “me dê uma moeda!” De pronto eu disse: “não”.  A minha negativa se justifica pelo fato de que a moeda pretendida serviria para financiar a farra de um grupo de veteranos, que estava bem acomodado à sombra de uma árvore, do outro lado da pista. A bela estudante ouviu o meu “não”, e com serenidade continuou a sua andança entre os carros, sob o olhar sádico dos organizadores do trote.           
A zombaria estudantil, seja ela realizada dentro ou fora do muro da universidade, suscita algumas questões que a meu ver, interessa a muita gente: o que leva alguns calouros a submeterem-se a situações vexatórias e constrangedoras, como sendo uma simples “brincadeira” ou “tradição”? Será a garantia de não serem excluídos do grupo e perseguidos pelos veteranos, ou a exibição pública do seu novo status? O que acham os líderes de entidades estudantis sobre a mendicância festiva nos sinais de trânsito, praticada pelos seus liderados? E os gestores das universidades, como vêem o nome e o endereço das instituições sendo coadjuvantes deste espetáculo medíocre?
A postura deselegante e mesquinha de minha parte, ao negar uma moeda para aquela beleza anônima, foi por entender que a aprovação no vestibular não deve ser motivo de constrangimento, mas a celebração de uma conquista: a inserção do jovem na universidade, no papel de agente transformador da sociedade.


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