sábado, 4 de dezembro de 2010

Crônica

A bodega


Zé de Pedro montou um comércio sortido na sala de casa, no Sítio Aguilhadas, mandou abrir um letreiro bem grande “Mercearia São José – Aqui tem tudo” e, nos primeiros quinze dias, correu a vizinhança fazendo a propaganda na base do boca a boca. Em cada residência do lugar pregava os argumentos em favor de sua venda:
            __Não precisa mais ir bater na rua pra fazer suas compras, porque agora tem a minha mercearia que vende o que você precisar!
Zé tinha razão. A distância pra cidade dava quase uma légua, uma hora de caminhada, em passada de metro, pouca coisa menos no espinhaço dum jumento ligeiro – bicicleta, nesse tempo, era coisa de rico – e se na quitanda dele tinha até, como dizia, “alpargata pra cobra e brida pra gato”, não havia necessidade de perder um tempo danado com uma viagem dessas.
Situada entre as comunidades de Aguilhadas e Cantinho, a bodega de Zé podia também abarcar a freguesia de boa parte do Sítio Gangorrinha, que ficava do outro lado do rio.
Cavaquista, Zé de Pedro foi não foi se estranhava com quem que tentasse diminuir o valor do seu mercadinho. Uma vez virou bicho, porque um freguês, chateado por não ter milho de pipoca, chamou o estabelecimento de bodega de beira de estrada.
__ Só vende Farinha e cachaça!
O troço ficou feio. Troca de impropérios, um “Cão de bico” daqui, um “Infeliz das costas ocas” de lá. A coisa quase vai às vias de fato.
Certo dia, o comerciante estava sentado na calçada em sua cadeira ginga-ginga de fitilo, quando avistou Seu Romão apontar na curva do córrego do velho Panta. Entrou na bodega, espanou o balcão e aguardou a chegada do comprador. Seu Romão era da comunidade de Cafundó, morava um pouco distante das Aguilhadas, sinal de que o negócio estava se expandindo. Alem disso era ele um patriarca de respeito, muito querido nas redondezas, ia agregar valor à quitanda. Porem, toda expectativa do bodegueiro caiu por terra, quando ele notou que o jumentinho preto que conduzia seu virtual freguês não desviou, sequer um palmo, da estrada que levava à cidade. Intrigado, pulou o balcão, correu porta afora e gritou:
__ Seu Romão!
__ Opa! Respondeu o senhorzinho puxando o cabresto do jegue Gavião e dando meia volta para encarar seu interlocutor.
__ O que foi?
__ Pra onde o senhor vai, homem de Deus?
__ Ora, vou pra rua!
__ Vê o quê? Que mal lhe pergunte?
__ Comprar umas coisinhas!
__ E por que não compra aqui mesmo?
__ Aí nessa sua venda tem o que eu quero?
__ Aqui tem de tudo!
__ Tem envelope pra carta?
__ Oh! Rapaz, tem não!
__ Então me deixe seguir minha viagem em paz!


                                                                         Zenóbio Olioveira

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